top of page
Buscar

Quais são as leis?

Foto do escritor: Sandra TavaresSandra Tavares

Atualizado: 25 de dez. de 2024

Há pouco mais de uma semana eu comprei uma cachorrinha. Uma Shitzu, fêmea, menos de 90 dias de vida, para colocá-la no lugar que eu creio da alegria, querendo trazer uma alegria infantil para o lar. Claro que já tenho duas crianças crescidinhas - Gabriel com 14 anos de sua adolescência, e João que chega aos 10 anos no próximo dia 22 de agosto. Eu quis a cachorrinha, como que querendo um alento para a dor, uma rolha para a garrafa do meu luto.

Como todo filhote, tive que dormir com ela algumas noites, e ela era uma lady fofa, chorava muito pouco e só soltava uns grunidos. A primeira noite ela passou com meu filho, 4 noites subsequentes comigo e a última com meu filho de novo, até sua doação para outro lar. Um filhote cheio de energia, querendo brincar com a gata adulta que já tínhamos em casa não deu certo. A gata estava pelos cantos da casa, sem comer direito...e tudo parecia o caos. O cheiro de murrinha de cachorro dentro do apartamento. Ou seja, a rolha para o meu luto não coube na boca da garrafa da minha dor.

A Yu Li Na ou simplesmente Lina - como demos o nome - foi para outro lar, para ser amada e cuidada exclusivamente, sem outro pet no outro lar. As madrugadas dormindo com ela me fizeram refletir sobre essa minha dor. Que dor é essa? A dor da perda seguida de outra perda. Minha mãe em 2021 e meu pai em 2024. Menos de 3 anos entre eles. 872 dias separam esses dias dessas perdas. 104 dias sem meu pai. E, à noite, lidar com o cheiro da cadelinha, pois todo cachorrinho tem um cheiro de cachorro, me fez entrar dentro de um lugar dentro de mim que incomodou profundamente. A paranóia de limpar a casa se intensificou. Na verdade sempre tive manias de limpeza bem significativas.

Limpar e organizar por fora sempre foi uma forma - tenho consciência disso - de limpar e organizar por dentro. Quando limpar uma simples casa se transforma em uma repetição que leva ao cansaço, pode ser um alerta para um transtorno.

Acho que tenho um pouco desse tal TOC. Já vi mães entrarem na minha casa e comentarem 'Nossa como sua casa é organizada. Lá em casa não é assim não'. Eu sei que nesse comentário existe uma certeza: a de que eu arrumo demais. E arrumo porque cresci num lar onde isso não era importante. E meu quarto era o oposto da minha casa toda. Eu tinha mania de passar meus uniformes de trabalho, enquanto ouvia minha mãe dizer: 'menina, para quê vc tá tendo esse trabalho?'. Para mim sair com uma roupa passada era uma questão muitíssimo importante.

Mas a coisa toda foi degringolando quando percebi que estava exausta. Exausta de limpar a casa, com o objetivo de remover o cheiro de murrinha de cachorro de dentro de casa. Óbvio que o cheiro não sairia sem a saída da mais nova moradora de 4 patas da casa. Busquei entender o que aquele cheiro me trazia, no que ele tanto me incomodava. Encontrei dentro de mim a resposta. Tratei de achar uma ONG que passou, pegou a cadelinha, e a encaminhou para um novo lar.

Foi dolorido passar a cadelinha para a ONG. Muito doloroso, pois parecia que eu estava passando um pedaço de mim. Mas ao mesmo tempo eu sabia que eu não estava - e não estou - saudável o suficiente para cuidar de mais um pet, além da gata que já temos em casa. O processo foi tão difícil que a ONG buscou, me devolveu porque eu a queria de volta, e depois de um telefonema meu a ONG voltou pela 2a vez e de fato a levou.

Busquei minha terapeuta no dia seguinte, e ela me ajudou a entender algo bem simples: a de que está tudo bem não estar tudo bem na vida da gente. Meu pai está fazendo muita falta, estou sentindo muito a falta nem sei como listar: do cheiro dele - mesmo quando eu tinha que pedir pra ele tomar um banho porque estava se descuidando, da voz dele - mesmo se ralhando comigo, da benção, do sorriso, do olhar - mesmo quando era um olhar repreensivo. Sabe a falta de tudo na pessoa? A falta de tudo...o pacote completo, das coisas mais lindas naquela pessoa, mas também das coisas mais horrendas? Porque somos feitos disso mesmo, de luz e sombra. Do bom e do pseudo 'ruim'. Somos apenas humanos, em nossa humanidade. Imperfeitos em nossa imperfeição.

E como sou enjoada como ele, chata, ranzinza, cheia de manias, como ele. Reclamona, às vezes ingrata...como ele. Sou um pedacinho dele. E me vejo nele. E provavelmente ele, em vida, se via em mim, assim como se via no João, meu caçula e neto dele. E constatar que tá tudo bem não estar tudo bem foi tão confortante! Tão necessário chorar na frente de minha querida Marieta e ver que tá tudo bem estar em frangalhos. E ver que a alegria de uma cadelinha não consertaria e nunca consertará isso porque o que consertaria seria a presença, sorriso e meu pai, por inteiro.

Todo Dia dos Pais, de menina até os tempos de agora...foi dia de lembrançinha com gravatas da escola, feitas de papel, beijo e muito almoço, camisas e bermudas escolhidas a dedo por mim, sandálias, relógios, coisas e objetos por meio dos quais tentava materializar uma centelha, uma fagulha de tudo aquilo que eu sentia dentro do peito. E nada, absolutamente nada do que eu levava, embrulhado num lindo papel de presente, foi suficiente. Porque o que ele mostrou pra mim e meus irmãos foi concreto, mas um tanto quanto invisível, ao mesmo tempo eterno e forte. Foi Amor. Foi a concretude das ações. Da presença. Da simplicidade de estar junto.

Esse dia dos pais tá dolorido demais. E eu sei que a sua falta tá doendo mais do que eu imaginava que doeria. Achei que quando você fosse eu ia passar por uma data dessa 'mais tranquila'. Mas não tá tranquilo constatar que não tenho a concretude de você aqui, conosco.

Não existem regras nem leis que determinem como vai ser, a gente sem uma parte da gente mesmo. Não se sabem as leis...que regem esse processo para ninguém. Mas pelo que tudo indica vão ser as leis taoistas do Yin e Yang. Em que a centelha do Yin está dentro do Yang e vice-versa. A alegria contida na tristeza, e a tristeza, que se bem vivida, leva à valorização dos simples momentos alegres vividos. Do dom da paciência consigo, com o outro e com o processo. Dando tempo ao tempo, dentro de mim mesma. Sentindo a tristeza e vivendo a dor. No tempo que der, do tamanho que ela vier.


Ps: Passei o dia (dos pais) com minha irmã, almoçamos, tomamos café e vimos fotos antigas dos álbuns. Segui o meu coração.




104 dias sem meu pai = 1+4=5, e o Livro Sagrado I Ching me diz:

Mais informações em Fonte: https://iching.com.br/hexagrama-05-espera/


872 dias separam a dor de perdê-los =8+7+2=15+2=17=1+7=8 e o Livro Sagrado Tao The King me diz:


08 – A virtude da Água (Novo)

A suprema virtude é como a Água.

Vivifica a todas as coisas sem se opor a nada.

Flue em lugares inferiores rejeitados por todos.

Por isso a Água representa o Dao.

Como a Água:      

No permanecer, fique próximo à terra.

No sentimento, vá fundo no coração.

Na relação com os outros, seja tolerante.

Na fala, seja sincera.

No governo, seja harmoniosa.

No trabalho, seja competente.

Na ação, aguarde o momento oportuno.

A suprema virtude não disputa.

Por isso é irrepreensível.


 
 
 

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page